Quando eu me criava, só havia escola secundária (liceu) na capital de distrito, a 60 quilómetros de distância da minha aldeia. Obviamente que só ia para o liceu quem podia pagar um qualquer tipo de pensão ou residência na cidade, o que, por si só, afastava do ensino secundário mais de 90% da população.
A minha terra continua lá, mas as crianças de hoje têm uma escola secundária a 9 km e outra a 12 km, com transporte gratuito…
O ensino nos liceus era gratuito, mas não era para todos, como se vê, nem sequer para os mais capazes. Era para os mais abastados.
Esta discriminação de base económica perdurou durante o Estado Novo, cujos ideólogos sabiam que para manter o povo controlado, só uma minoria devia ter acesso aos graus de ensino mais elevados. Ao povo bastava a quarta classe. Mesmo assim, no efectivo que fez a guerra colonial mais de metade não tinha a quarta classe à data da incorporação.
De facto, no sentido em que só davam acesso aos privilegiados, os liceus de então tinham o pedigree dos colégios privados de agora, com a vantagem de serem suportados pelo estado. O que se anda por aí a reivindicar com caixões não é mais do que isto: O elitismo que as escolas públicas não garantem.
Não me ofende o elitismo no ensino, pelo contrário. O que me ofende é que seja pago pelo estado, isto é, por todos nós.
Quem quer educação com pedigree deve pagá-la. Dantes é que as minorias dispunham dos dinheiros públicos sem se preocuparem com as necessidades da maioria.