Passos Coelho foi um beneficiado da crise da bolha financeira que deflagrou em 2008, a meio do primeiro governo de Sócrates, até então com um exercício globalmente positivo.
Apesar de já ter negociado com a Comissão Europeia, Eurogrupo e BCE, um conjunto de medidas que ficaram conhecidas por PEC IV, a Sócrates e ao seu segundo governo minoritário faltou em 2011 a solidariedade de todos os partidos da oposição ao rejeitarem o PEC IV. Tendo acabado por se demitir sob pressão do Presidente Cavaco Silva, o verdadeiro líder da oposição ao governo do PS, Sócrates resistiu até o limite, mas foi obrigado a aceitar a vinda da Troica, em cujas negociações o comportamento dos representantes do PSD deveria ficar na história como exemplo do que como se pode atraiçoar a pátria, fingindo que se defende.
Entronado no governo com a bênção de Cavaco, Passos Coelho depressa se vangloriou de "ir além da Troica", fazendo cortes em salários e pensões e impondo um "enorme aumento de impostos", para usar a expressão do então Ministro das Finanças, Vítor Gaspar, que ao demitir-se reconheceu por escrito os erros cometidos pelo governo de que fez parte.
Quem nunca reconheceu esses erros foi o principal responsável, Passos Coelho, que para substituir o arrependido Gaspar nomeou sem pestanejar Maria Luís Albuquerque, provocando a "demissão irrevogável" de Paulo Portas, abafada com o maior cinismo por Cavaco Silva.
Sempre cantando e rindo, Passos Coelho ironizava com as dificuldades que os portugueses enfrentavam, aconselhando-os a emigrar e apodando de piegas os que se atreviam a protestar. O empobrecimento do povo dava-lhe gozo.
Apeado da governação após as eleições de 2015, e não se conformando com as decisão da maioria parlamentar que chumbou a sua proposta de governo e veio a aprovar as proposta do Governo PS, Passos Coelho apostou tudo em dois cenários:
1 - Na fragilidade da aliança alcançada pelo PS para governar;
2 - Na inevitabilidade dos problemas que adviriam do abrandamento da austeridade e da reposição de salários e pensões.
Cenários como o agravamento do deficit e as pressões exercidas pelos mercados sobre a divida, também passavam pela cabeça de Passos Coelho, que assim ia congeminando o seu regresso, contando com a ansiada ajuda do diabo.
O diabo até deve ter andado por aí, pois os incêndios foram demais. Porém, quanto ao deficit, desceu para níveis nunca atingidos em democracia e os mercados acabaram por ser "obrigados" a tirar-nos do lixo, facilitando o financiamento da economia que está a crescer como já pouca gente se lembra.
Enquanto esperava pela vinda do diabo, o líder do PSD foi adiando as decisões sobre as autárquicas, um problema menor para quem vive de sonhos mais altos.
O aumento do emprego, o crescimento da economia, ou a melhoria da opinião dos mercados, foram porém notícias catastróficas para a estratégia de Passos Coelho, que, atordoado, desceu à terra aos trambolhões..
No entanto era tarde para corrigir os erros das autárquicas de que, em rigor, Passos nem fala, limitando-se a criticar o governo inspirado pelas fake news.
Isto é um sintoma de que ele não mudou e continua desfasado da realidade, não se dando conta de que a cama onde vai acordar depois das autárquicas já está feita.